terça-feira, 1 de março de 2011

Há vidas assim...

Há vidas que se despedem sem lágrimas. Apenas com lembranças. Há vidas assim tão vividas, tão dissecadas, em que tanto se amou, em que tanto se sofreu, em que tanto se viveu... Que quando se despedem não há anos, experiências a lamentar.

Via-a ontem, deitada sobre aquele leito branco de cetim, rodeada de flores. Uma simples blusa às flores, uma saia castanha. Gordinha, até. E parecia rosada. Tão quieta que mais parecia uma pintura sua do que o seu corpo. Foi o que mais estranhei. Vê-la tão sossegada, sem expressão no rosto. Juro que cheguei a ver o vai e vem da respiração. Porque tão sossegada não poderia ser ela. Se de facto ela tivesse respirado não me assustaria como seria normal, pois não me habituei a vê-la morta.

Não houve lágrimas. Houve até sorrisos nos que a recordaram. Alegre e de pé solto. Velha gaiteira. Viúva alegre. Boa. E feliz!

Marlene Silva

Homenagem à Ti Zulmira Gabina, que, de camarote, me viu crescer e me lembrava que eu era como a minha avó, a pessoa que eu mais amei no mundo

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