Um dia bateu à porta da bruxa um mendigo. Esfomeado e a tremer de tanto frio, pedia um momento junto ao lume e um prato de comida. A bruxa hesitou em deixá-lo entrar. Era claramente alguém de fora da aldeia e temia as suas intenções. Mas havia algo no olhar dele que lhe despertava confiança. Deixou-o entrar e serviu-lhe um prato de sopa. Atiçou o fogo e foi, à luz das chamas, que percebeu que conhecia aquele rosto… Era o do velho sábio. Lendo o pensamento da bruxa, o sábio revelou-se:
- Vim ver com os meus próprios olhos aquilo que me chegou aos ouvidos. Seguiste o meu conselho e, por isso, serás recompensada: cultivaste e alimentaste o amor; está na hora de o colheres. A duas léguas daqui há um palácio e nele vive um príncipe à procura de noiva. Consultei a bola de cristal e ela diz-me que este é o homem que amarás e que te amará. Amanhã, partirás em viagem.
A bruxa lavou e a escovou cuidadosamente os seus cabelos, vestiu o seu melhor vestido e partiu.
O caminho era tortuoso. As raízes das árvores rompiam o chão e logo a bruxa teve de se descalçar para seguir caminho. As teias de aranha pespegavam-se aos cabelos e começou a enfurecer-se. De certeza que aquela era uma partida do velho. Príncipe algum se apaixonaria por uma desgrenhada.
Estava tão chateada a afastar as árvores e as teias de aranha que quando reparou num lobo parado à sua frente já estava quase em cima dele. Pela primeira vez, não conseguiu pensar em nenhum dos seus poderes para afastar o animal. Mas ele não atacou e acabou por se prostrar aos pés da bruxa. Foi aí que ela viu o sangue no pescoço do lobo. Passou a mão pelo pêlo ensanguentado, sujando-se ainda mais.
Marlene Silva
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