sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

PÃO COM MANTEIGA & LEITE SIMPLES (histórias simples para gente que também o é...)

Na escola, a hora do recreio da tarde era aquela agitação. Finalmente chegava a pausa merecida com direito a lanche e tempo para brincadeiras. O relógio da barriga já tinha dado horas e os miúdos escolhiam a melhor sombra para disporem as suas lancheiras e retirar delas o seu repasto.


Hello Kitty, Homem Aranha, Noddy, Ruca, Wix, Panda e outros bonecos juntavam-se ao lanche! Estavam nas imagens das lancheiras, no pacote das bolachas, nas embalagens de sumo, em todas as saquetas coloridas que escondiam bolos e outras iguarias que pareciam fazer crescer água na boca. Pela cara de alguns meninos e meninas aquilo era mais fogo de vista que outra coisa, mas aquela novidade na prateleira do supermercado tinha-lhe valido uma birra e uma negociação com os pais em troca de alguns bons comportamentos, por isso, muitos, melhor, quase todos, diziam que aquilo era delicioso, bué de fixe mesmo. Mnham, Mham... Todos queriam provar estas refeições modernas e tão coloridas,

Bem todos, todos, não. Havia uma excepção: a Mafalda.


A diferença começava logo na lancheira da Mafalda. Não era de plástico, não era de cartão, não era de nenhum material xpto, hiper, mega moderno ( tipo dos que piscam e trazem livros de instruções). Mafalda tinham uma bolsa de pano, feita à mão e com um bordado que a identificada (um M e uma borboleta, uma borboleta porque quando a mãe de Mafalda andava grávida dizia que tinha borboletas na barriga. Por isso, quando a Mafalda nasceu não se livrou deste cognome voador)).


Mas voltando à bolsa lancheira, a criadora tinha sido a sua avó que já tinha feito o mesmo para as filhas e que fazia agora para as suas netas e sobrinhas.


Quando Mafalda se sentava e pousava a saquinha no colo, cuidadosamente, as outras miúdas comentavam baixinho: " Lá vem ela com o seu artesanto", e lá se soltavam uns risinhos irónicos que Mafalda ignorava com a sua terna sabedoria.


Até que alguém, mais atrevido, decidiu perceber porque é que Mafalda não tinha uma lancheira da moda, nem trazia para a escola lanches "normais".


Mafalda sorriu e decidiu revelar o seu segredo ao colegas.


Afinal, os seus lanches eram muito mais normais do que os deles. Não precisavam de chocolate, de recheios ou ter pintarolas para serem mágicos.


A magia começava na saquinha de pano, feita pela avó, só para ela, com o carinho que uma avó pode colocar em todas as coisas que faz para os seus netos. Era ecológica, lavava-se com facilidade e podia ser sempre reutilizada. O pão com manteiga não era um pão normal. Era um pão em forma de flor, da padaria do Sr. Carlos, que já tinha fornecido o pão quando os avós eram mais novos, quando os pais eram crianças e que agora fazia para ela. O truque, como dizia, o Sr. Carlos é comer pétala a pétala e deixar o "coração" da flor para o fim. Era lá que a mãe colocava a nozinha de manteiga que derretia na boca na ultima trinca.


" Deixa o melhor para mim, Mafalda. Não te esqueças". E ela não se esquecia.


E o leite, simples porquê? Porque o leite ou é ou não é. Com chocolate, ficava castanho, confundiam-se aromas e sabores. O chocolate é chocolate, o leite é leite e faz muito melhor assim.


Os amigos ouviram a história concentrados em todos os detalhes. Afinal, a Mafalda podia comer todas as guloseimas do mundo. Mas seriam esses lanches, mesmo lanches? Ou guloseimas que se rotulam de lanches de crescimento e afins?


Afinal, o lanche da Mafalda não precisava de ter bonecos para também ser (e contar) uma história, uma história simples mas que era a dela e só dela.


Curioso, curioso, foi ver os lanches dos meninos no dia seguinte. Um trouxe um cesto de maçãs do pomar do avô, o outro tostas com doce de amora que a mãe tinha feito, outra um cestinho com bolachas de manteiga que tinha feito com a irmã, e outro..., e outro...


A partir desse dia, os meninos começaram a fazer lanches partilhados. Cada um trazia o seu contributo, a sua sugestão e o mais curioso?

Nenhuma vinha em embalagens da moda nem tinha saído directamente da prateleira do supermercado...


Paula Machado

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